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Transmídia: Exposição excessiva é uma necessidade de autoafirmação

O psicólogo Edjofre Coelho explica que as pessoas querem mostrar diariamente que estão fazendo.

19/08/2017 08:01

Fotos no Instagram a cada 30 minutos, registro de todos os momentos do dia nos stories, "textões" no Facebook, desabafo e ostentação são características de pessoas que não conseguem passar um dia sem acessar as redes sociais. Muitas delas, mesmo sem nada para publicar, navegam na rede por horas apenas deslizando, curtindo, compartilhando e comentando a publicação dos amigos virtuais.

Para o psicólogo Edjofre Coelho, esse hábito se trata de uma necessidade de autoafirmação que induz a pessoa a registrar e estar por dentro de tudo. Segundo ele, as pessoas sempre tiveram esse desejo de fazer com que os outros soubessem como elas vivem, o que têm e fazem. Com o desenvolvimento tecnológico e a ascensão da internet, essa autoafirmação apenas foi facilitada, possibilitando que as pessoas mostrem, em tempo real, o que desejam que os outros saibam.

“A exposição na internet é uma necessidade de autoafirmação, de fazer o outro saber. As pessoas querem mostrar o que estão fazendo. Muitas vezes, uma demonstração que nem corresponde de fato ao que estão vivendo. Por isso que postam, por exemplo, comidas, quando estas são mais refinadas. É muito difícil postarem comidas triviais. A primeira oportunidade que alguém tem de ir a restaurantes ele registra, porque é questão de mostrar que pode consumir aquilo, ou transparecer que faz parte da rotina dela, mesmo não sendo”, explica o psicólogo.


Alguns usuários compartilham dados pessoais no mundo virtual (Foto: Jailson Soares/O Dia)

Alguns usuários vão ainda além, compartilhando dados pessoais no mundo virtual e tornando-os de domínio público. Uma pesquisa do Meus dados preciosos: Perigo desconhecido da Kasperky Lab divulgada este ano indicou que, no Brasil, 96% dos usuários compartilham suas informações digitalmente, sendo que 66% compartilham fotos e vídeos de seus filhos e 45% compartilham vídeos confidentes e fotos de outros.

O resultado mostrou que quase metade dos usuários de internet brasileiros (49%) tornam suas informações públicas, o que é muito preocupante. Uma vez que os dados entram no mundo virtual, ele pode viajar além do controle de seus proprietários e cair no conhecimento de pessoas erradas, que usam aquelas informações para cometer crimes virtuais, modalidade que tem crescido bastante nos últimos anos.

Jovens são os que mais usam a internet sem controle

Por nascerem em uma geração onde a tecnologia já estava bastante avançada, as crianças e os jovens são os que mais usufruem da internet e, consequentemente, das redes sociais, de forma desenfreada. Conforme Edjofre, diferente das pessoas com mais idade, que passaram muito tempo da vida tendo outras prioridades e pensando de uma outra forma, a juventude dessa geração, já nasceu na era da informática, portanto, a internet foi a forma que encontraram e conheceram de contatar pessoas e de demonstrar seus próprios pensamentos.

Em Teresina, é muito comum identificar jovens que navegam na internet quase 24h por dia. Uma estudante de 20 anos que preferiu não se identificar afirma que se considera uma pessoa viciada no celular, assim como na internet, e relata que chegava a utilizar as redes sociais quase o dia todo, a ponto de fazer publicações a cada hora.

As postagens da estudante variavam entre frases, compartilhamentos, textos, fotos, vídeos e atualização de stories de todas as redes. O que ela não conseguia era ficar sem publicar algo. O vício era tanto que ela mesma começou a se preocupar com a situação. Depois de refletir, tomou a iniciativa de dar um tempo no mundo virtual e excluir as redes sociais.


Foto: Jailson Soares/O Dia

“Eu estava viciada demais, já consegui ficar sem as redes por mais de duas semanas e pretendo ficar um pouco mais, pois preciso focar no trabalho e estudos. Sem contar por conta dos riscos. As pessoas usam as redes demasiadamente, sem lembrar dos riscos que correm. E fora que existem muitas pessoas que associam tudo que você posta com a sua atual situação. Se você postar alguma frase triste é porque está triste, mais nem sempre é assim. Eu mesma posto porque acho interessante”, esclarece a estudante.

Ela comenta ainda que, mesmo tendo conseguido ficar sem as redes por semanas, sente muita falta do celular e não consegue ficar longe dele. Ainda que seja apenas para mexer no aparelho. “É como se eu tivesse nua. Mexo no meu celular toda hora ou é ouvindo música ou jogando. Quando eu estava ativa nas redes, todo tempo livre, eu estava no Instagram, Facebook, Whatsapp”, diz.

Orientação Como a geração jovem é a que mais navega na internet, o psicólogo orienta que os pais estejam atentos e em alerta ao que os filhos fazem quando estão com qualquer dispositivo eletrônico que dê acesso à internet em mãos. “O que a gente deve ter cuidado é no acompanhamento. É totalmente necessário que os pais acompanhem e saibam de fato o que a criança está postando, quem são as pessoas que ela está se relacionando, quem comenta suas postagens e como comentam. Observar se as postagens são convenientes à idade. É bom conferir até as próprias páginas que a pessoa curti, comente, compartilham”, orienta o especialista.

Edjofre enfatiza que é importante as pessoas saberem usar a rede a seu favor, saber tirar da tecnologia o melhor que ela pode oferecer, como pesquisas e comunicação. “Esse aproveitamento fica impossível se pessoa for dependente da internet, se a pessoa não consegue soltar o celular ou o computador e até quando as pessoas passam mais tempo postando o que estão vivendo do que propriamente vivendo”, alerta ele.

Uso desenfreado da internet pode causar problemas de saúde aos usuários

O uso exacerbado da internet bem como dos dispositivos eletrônicos que dão acesso à rede, como celulares, tablets e computadores, podem trazer inúmeros prejuízos à saúde humana. A psiquiatra Daianny Macêdo enfatiza que, além de levar a uma compulsão caracterizada pelo medo irracional de permanecer isolado e desconectado do mundo virtual, o uso desenfreado também interfere no comportamento das pessoas e as deixa dependente da rede.

“Medo, ansiedade, estresse e ataques de pânico, como tremores, sudorese, tontura, dificuldade em respirar, náuseas, dor no peito, aceleração da frequência cardíaca, podem surgir em pessoas que são muito dependentes da internet e esquecem o celular, por exemplo. O fato de ela perder conectividade ou descarregamento do aparelho a deixa angustiada”, explica a especialista.

A psiquiatra destaca ainda que dentre as principais doenças relacionadas ao mundo digital está a nomofobia, um transtorno de pessoas que não conseguem ficar longe do celular por muito tempo. Entre os sintomas, estão o controle constante das redes sociais e e-mails, deixar até de se alimentar para permanecer conectado, escutar o telefone tocar ou vibrar mesmo estando desligado, supervalorização de relacionamentos superficiais nas redes sociais em detrimento dos relacionamentos reais e manusear o celular em qualquer situação, mesmo em ambientes inapropriados, tais como restaurantes, reuniões, levando o aparelho até mesmo quando vai ao banheiro.

Além de nomofobia, ansiedade, depressão, problemas de visão, dificuldade de comunicação no mundo real e vícios em jogos também são transtornos que podem acometer pessoas que não navegam no mundo virtual de forma adequada. Doenças estas cada vez mais identificadas entre os jovens e que, portanto, precisam de uma atenção maior.

Redes Sociais: divulgação indevida afeta reputações e incentiva a violência

O uso descontrolado e a exposição demasiada nas redes sociais, além de trazer problemas para a pessoa que navega e divulga, também tem o poder de denegrir e afetar a vida do outro. Dado a proporção do alcance que a internet tem, é muito fácil alguém gerar uma série de conflitos na vida de um indivíduo com uma simples postagem sem consentimento dele. Uma divulgação indevida é capaz de gerar doenças, destruir reputação e incentivar até a violência física.

A especialista em marketing digital Larissa Almeida explica que, quando alguém tem um fato da sua vida exposto na internet, com ou sem consentimento, não é possível prever ou controlar o alcance desse conteúdo. “Já vimos inúmeros casos de posts em redes sociais que rodaram o mundo, geraram demissões, destruíram casamentos, causaram muitos problemas para os envolvidos. Não dá para subestimar nem um pouco o poder das redes sociais em destruir a reputação de uma pessoa ou marca em questão de minutos”, enfatiza ela.


Foto: Moura Alves/O Dia

Um exemplo disso foi o caso da enfermeira que foi afastada do serviço no Hospital de Urgência de Teresina depois de ter publicado no Instagram uma selfie dela durante a cirurgia e captação de órgãos de Júnior Araújo, jornalista e idealizador do Coletivo Salve Rainha. Além do afastamento da profissional, também houve a abertura de um processo administrativo e o Conselho Regional de Enfermagem (Coren) foi comunicado do caso.

Esse é apenas um exemplo, de vários que acontecem durante todo o ano e em diversos lugares do mundo, de pessoas que são prejudicadas por divulgação e publicação excessiva e desnecessária nas redes sociais.

Cyberbullying

A violência virtual, mais conhecida por cyberbullying, é uma das que mais acometem crianças e jovens em todo o mundo. Com a ideia de que atrás de uma tela é possível praticar crimes e não ser punido, pessoas mal intencionadas utilizam fotos, vídeos, inventam histórias para denigrir a imagem do outro. Larissa destaca que esse problema é outro mal da internet e alerta para a seriedade dos efeitos na vítima.

“A palavra correta é crime. Expor, ofender, depreciar o outro na internet é um abuso psicológico que causa muitos danos, especialmente para as crianças e adolescentes. Os chamados memes e vídeos divulgados sem consentimento formam uma rede de constrangimento tão forte, que são capazes de gerar violência física, depressão e uma série de problemas para a vítima”, ressalta a especialista.

Com o avanço e a rapidez da internet, esses memes começam em um grupo de Whatsapp entre amigos e, quando menos se espera, o mesmo meme já está sendo divulgado em páginas nacionais e até internacionais. As risadas e divertimentos de milhares de pessoas custa a vergonha e constrangimento de uma outra. Sentimentos estes que, com o tempo, podem se transformar em doenças graves que afetam a vida de toda uma família de forma perigosa.

Por: Karoll Oliveira - Jornal O Dia
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