Outro dia eu caminhava
pela passarela da BR 316, à altura do bairro Lourival Parente, e
observei as luzes dos postes que se enfileiravam, uma após outra,
bem à minha frente. Era noite e a lua estava cheia; estrelas
cintilavam no céu da Zona Sul e carros passavam velozes com faróis
ligados. Tudo tão iluminado que achei bonito. Contudo, dei conta de algumas
pessoas que caminhavam ao meu lado, cujas expressões contrastavam
com o cenário descrito. Por um momento senti medo. Não por ser
mulher e estar andando sozinha à noite; de ser assaltada ou abordada
por algum estranho. Tive medo do vazio que vi ali estampado naquelas
faces pesadas, arrastadas por corpos cansados e para quem o céu
estrelado, ou a lua fulgurante não significavam grande coisa.
Na manhã seguinte, de dentro de um coletivo, olhei pela janela e percebi mais algumas pessoas que transitavam - sob a luz do sol imperioso de Teresina - como se fosse noite. A noite mais escura. E cada vez mais encontrava, numa esquina onde um malabarista se preparava para fazer um número no sinal; na escada onde um casal trocava beijos e até nas igrejas estavam pessoas inertes. Ignorando todos os sinais em volta.
É um fato incontestável: as luzes estão se apagando. Existem os astros, os postes espalhados pelas cidade e o abajour que enfeita o canto da sala. Mas a vida parece que está descarregando, e aos poucos estamos todos parando, se já não estivermos parados.
Alguém anuncia no jornal que o número de mortes aumentou na capital. Eu me pergunto: e o número de vivos que estão mortos? Eles andam, falam, compram mas não estão realmente ali. Estão mortos-vivos.
E eu tenho medo. Tenho medo dessa apatia que está tomando conta dos dias e das noites; da omissão aos gritos silenciosos; das angústias expressas em spray nos muros que não obtém respostas, pois não há quem veja ou escute. E a impotência de certa maneira também mata.
Então se você, querido leitor, pode ler estas linhas eu recomendo-lhe fortemente a cantar suas canções, chorar suas dores, recitar seus poemas e abraçar aos seus com toda a força, até deixá-los sem ar. Ouça, veja, ame. Depois disso vá para a frente do espelho e certifique-se de que a pessoa ali refletida está viva. Se estiver é porque ainda resta uma luz acesa, e se está acesa, ilumine. Por favor, ilumine.
Aldenice Sousa