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Boris, o bravo e o "œBrexit"

Confira o texto publicado pelo colunista Celso Pires na edição desta quinta-feira (1º) no Jornal O Dia.

01/08/2019 08:17

O dramático seriado do “Brexit” caminha para mais uma temporada. Em 23 de julho, o Partido Conservador anunciou o resultado da eleição para escolha do novo líder da sigla e futuro primeiro-ministro do Reino Unido. Sendo a pessoa que deverá conduzir, a partir de agora, a ruptura do país com a União Europeia. Por 92.153 votos a 46.656, o ex-ministro de Relações Exteriores e ex-prefeito de Londres (2008-2016) Boris Johnson, líder da campanha pelo “Brexit” quando o plebiscito foi realizado em 2016, foi eleito, derrotando o adversário Jeremy Hunt, atual ministro de Relações Exteriores. 

A primeira-ministra, Theresa May, deixou o cargo, após ver sua proposta de acordo para a saída da União Europeia derrotada três vezes no Parlamento. Tanto Johnson quanto Hunt são defensores do “Brexit”, mas o vencedor da eleição quer que o Reino Unido deixe o bloco europeu em 31 de outubro, com ou sem acordo e regras de transição. Jeremy Hunt tinha uma postura mais moderada e admitia a possibilidade de negociar uma prorrogação da data para negociar um entendimento que amortecesse o impacto do “Brexit”. Entretanto, com a escolha de Boris Johnson, o Reino Unido caminha possivelmente para uma ruptura radical com a União Europeia. 

O cenário herdado por Boris é de uma crise política que já derrubou dois premiês, pois além de May, David Cameron, renunciou diante dos resultados pró- “Brexit” do plebiscito realizado em 2016. Depois de dois adiamentos a pedido do governo britânico, a data para o “Brexit” foi marcada para o dia 31 de outubro. Existe pouca esperança de que seja possível encontrar um entendimento até essa data. Por isso, muitos defendem um novo adiamento da data. Mas Boris Johnson adotou como plataforma de campanha a ideia de que concretizaria o Brexit o mais rápido possível, ainda que isso signifique uma ruptura sem qualquer acordo. 

A proposta sobre os termos da saída do Reino Unido elaborada enquanto Theresa May estava no posto de primeira-ministra acabou sendo alvo de críticas tanto dos grupos pró- “Brexit” quanto dos que defendem um novo plebiscito capaz de revogar o “Brexit”. Entre os principais pontos do acordo estavam um período de transição de 21 meses para o fim das regras de livre comércio, para que o Reino Unido pudesse negociar acordos comerciais e normas alternativas que pudessem evitar prejuízos a empresas britânicas que exportam para a União Europeia e desabastecimento de produtos que chegam dos demais países europeus ao território britânico. 

Ainda estavam previstos no acordo garantias para que os europeus que já vivem no Reino Unido possam permanecer no país e que os britânicos que vivem em países europeus também pudessem continuar a viver e trabalhar nessas nações. Além disso, o Reino Unido teria que pagar uma multa de 39 bilhões de libras (cerca de R$ 181 bilhões) à União Europeia por romper o contrato de integração regional. Todavia, os defensores de um “Brexit” radical não querem pagar essa conta, nem se manter atrelados a regras aduaneiras por todo aquele período de transição. Já os pró-União Europeia querem um acordo que permita que o Reino Unido continue a fazer parte da união aduaneira e do mercado comum, ou seja, que os produtos exportados e importados entre Reino Unido e o bloco europeu continuem isentos de tarifas e que seja garantida a livre circulação de pessoas, bens e serviços.

Alguns parlamentares, principalmente do Partido Trabalhista, defendem inclusive um novo plebiscito capaz de revogar o “Brexit”. Tanto o grupo dos defensores de um “Brexit” radical quanto os pró -União Europeia se recusaram a ceder durante as últimas negociações, com a esperança de que suas posições prevalecessem. Ou seja, neste conturbado contexto, incumbirá a Boris Johnson a tarefa de chegar a uma solução. Johnson havia dito que, se fosse escolhido premiê, se comprometeria com o prazo de 31 de outubro, mesmo na ausência de um acordo com o bloco europeu. Ainda disse que se recusaria a pagar a indenização do “Brexit”, a soma de 39 bilhões de libras  que a União Europeia exige como compensação, a não ser que sejam oferecidos termos de negociação mais favoráveis ao Reino Unido. Johnson foi chanceler por dois anos durante o governo de Theresa May e deixou o posto depois de várias desavenças públicas com ela por conta justamente do “Brexit”. 

Em junho de 2018, ele declarou que a então premiê precisava mostrar mais coragem nas negociações com a U.E. e, nisso, contou com apoio explícito do presidente americano, Donald Trump, que mais tarde disse que Johnson faria um grande trabalho como premiê e daria um jeito no que chamou de "desastre" de May no “Brexit”. Recém-eleito, Boris retomará as negociações com líderes europeus. É possível que líderes do bloco sugiram uma extensão do prazo, o que é defendido por todos os setores que querem um acordo ou um novo referendo. No entanto os principais eleitores no novo premiê tenderiam a ficar frustrados caso a opção por uma saída cautelosa e prorrogue mais uma vez a saída do Reino Unido. A expectativa é que Boris Johnson adote uma postura mais agressiva nas negociações com a União Europeia, mas não se sabe se a estratégia será eficaz. Afinal de contas, os líderes europeus já disseram que não vão ceder e que o acordo negociado por May é o "único possível". O impacto econômico de toda essa conjuntura já está sendo forte, uma aura de imprevisibilidade permeia o porvir, ficando apenas a dúvida, se quem vai afundar primeiro será Boris Johnson ou o Reino Unido. O seriado “Brexit” é realmente dramático.

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