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80 tiros esclarecem dúvidas

Maria das Graças Targino - ([email protected])

17/04/2019 20:55

Dentre dias corridos de trabalho, em meio a obrigações, compromissos e pouco lazer, refletir sobre o caos que vem assolando o território nacional é o pouco que podemos fazer em prol de nossa coletividade, nossa família e nossa vida. Dar de cara com dados da pesquisa efetuada, agora, primeiros dias de abril, pelo reconhecido Datafolha, segundo os quais 51% dos brasileiros têm mais medo do que confiança na Polícia Militar (PM), é, no mínimo, estarrecedor, sobretudo, quando se pensa numa nação em pleno desenvolvimento. Do ponto de vista da Constituição Federal, o Artigo 144 define os tipos de polícias e, em especial, as duas funções centrais da PM (Parágrafo 5º), quais sejam, levar a cabo o policiamento ostensivo e preservar a ordem pública. Isto é, são agentes de segurança pública e, ainda, como prescrito no Parágrafo 6o, são forças auxiliares do Exército. Ou seja, em estado de emergência, estado de sítio e/ou situação bélica, os policiais militares podem ser requisitados pelo Exército para exercerem novos encargos no campo da segurança pública.

O Exército Brasileiro, por sua vez, uma das três Forças Armadas do Brasil, ao lado da Marinha e da Força Aérea, é responsável pela defesa do território em operações terrestres e, também, pela suprema garantia da lei, da ordem e dos poderes constitucionais. No entanto, em que pesem funções tão relevantes sempre em prol da população, Exército e Polícia Militar, não obstante seus profissionais honrados, ao longo dos anos, vêm se envolvendo, de forma crescente, em delitos de todas as naturezas. Casos e mais casos, quase sempre impunes, atestam a morte de inocentes pela PM e pelo próprio Exército, podemos dizer, em todos os Estados da União.

O último delito de grande repercussão (logo cairá no esquecimento) perpetrado pelo Exército refere-se ao cerco de carro que abrigava uma honrada família brasileira: marido; mulher e seu pai; o filho do casal de sete anos e uma amiga da família. Falar em cerco é pouco. O carro foi simplesmente fuzilado: nada mais, nada menos do que 80 tiros! Objetivo: permitir aos militares esclarecer dúvidas sobre a identidade dos passageiros. Milagrosamente, um único morto, Evaldo dos Santos Rosa, 51 anos, músico e segurança, além do sogro ferido. O ato insensato e leviano prosseguiu, mesmo quando a esposa, em desespero total, esclareceu quem eles eram e que seguiam para um chá de bebê, tarde do domingo 7 de abril! E o pior: de imediato, o porta-voz da Corporação no Rio de Janeiro veio a público esclarecer que a patrulha se deparou com um assalto em que dois marginais atiraram. Os representantes do Exército apenas reagiram à agressão.

Número elevado de testemunhas e gravações (louvados sejam os smartphones, nessas horas de dor) atesta que os militares nem tentaram parar o carro nem conversar, mas, sim, começaram a disparar contra o veículo. Diante da verdade irreversível, o Exército voltou atrás e promete justiça... Será? Justiça tardia? Justiça cor-de-rosa? Justiça azul-bebê? Como Fátima Rios colocou nas redes sociais, “confundiu carro da família com o de bandidos. Confundiu o guarda-chuva com fuzil. Confundiu a furadeira com uma arma, mas a cor vocês nunca confundem. Sempre preto, sempre!” Por Deus, se são necessários 80 tiros como tira-teima, sem trégua ainda que rápida (tal qual o voo do falcão-peregrino, capaz de atingir 320 km/h) para refletir, olhar e enxergar as vítimas como cidadãos, é evidente que o Exército (como a PM) está impregnado por racismo odioso e truculência mortal. Ninguém duvida que o veículo não teria sido fuzilado se seus ocupantes fossem brancos, com ar de poderosos e ricos.

Por fim, ainda segundo o Datafolha, para 81% dos brasileiros, Polícia (e Exército) não devem ter o direito de atirar em suspeitos sob o risco de atingir inocentes, o que contraria a postura do Presidente Jair M. Bolsonaro e dos Governadores de São Paulo, João Doria e do Rio de Janeiro, Wilson Witzel. Haja incentivo à violência! Viva a insegurança das ruas e das vielas!

Mero adendo: Na madrugada de sexta-feira, 5 de abril, antes de ação com 80 tiros, o Exército também matou no Rio, pelas costas, o jovem Christian Felipe Santana de Almeida Alves, 19 anos, durante blitz na Estrada Pedro de Alcântara, em Realengo.

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