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Chile: um jeito diferente de selecionar Diretores escolares

Confira o texto publicado pelo colunista José Almendra Filho.

16/10/2019 09:25

As transformações do sistema público de educação no Chile têm sua gênese a partir de meados da década de 1970. Historicamente o Chile sempre apresentou uma tendência de administração “centralista”, cabendo ao governo central (federal) grande parte da arrecadação de tributos, elaboração e implementação das políticas públicas, além da manutenção dos serviços.

Esse cenário foi modificado em 1975, com a promulgação da “Ley Orgánica de Administración Financiera del Estado” (Decreto-Lei 1263/1975), que reorganizou territorialmente o país, dando origem a 13 “regionais” (equivalente ao que chamamos de “região”), 51 “províncias” (equivalente ao que chamamos de “estado”) e 318 “comunas” (equivalente ao que chamamos de “municípios”).

Esse processo teve reflexos diretos na educação, ratificando, no período entre 1976 a 1989, uma progressiva municipalização das escolas. Na década de 1980 surgiu uma nova figura nas redes municipais – as escolas subvencionadas (ou “sostenedor privado”, conforme consta na Lei). Trata-se de estabelecimentos privados de ensino, porém custeados com recursos públicos. A ideia consistia em oferecer duas formas de escola gratuita: a municipal e a “privada subvencionada”. A lógica, nesse caso, tem relação com os princípios de descentralização fiscal e eficiência econômica, assumindo-se que uma maior competição entre escolas acarretaria incentivos naturais para a melhora na gestão do sistema.

Desde então, escolas municipais e subvencionadas têm convivido, representando, respectivamente, 68% e 27% do total de matrículas do ensino básico (os 5% restantes referem-se às escolas particulares). No Chile, diferente do Brasil (onde a educação infantil e ensino fundamental são prioridades dos municípios enquanto o ensino médio encontra-se sob a tutela dos estados), a esfera municipal provê todos os ciclos do ensino básico.

A promulgação da Lei 20.501/2011 (artigo 34o - “Calidad y Equidad de la Educación”) proporcionou uma ampla redefinição dos processos de gestão de recursos humanos na educação chilena. Na realidade, a implantação na rede pública ocorreu a partir de 2014 (portanto três anos após a promulgação da referida Lei), devido às fases precedentes de articulação e estruturação junto às esferas municipais. 

Vale ressaltar a existência de dois órgãos específicos: o “DNSC” (Direção Nacional do Serviço Civil), responsável pela operacionalização e coordenação do sistema de gestão de pessoas, e o “CNDP” (Conselho Nacional de Alta Direção Pública), que exerce funções normativas e regulatórias. Adicionalmente, insere-se nesse cenário a figura do “Chefe da Educação Municipal” (equivalente ao “Gerente Regional de Educação” nos Estados brasileiros), responsável pelo conjunto de escolas em uma municipalidade.

Portanto, temos cinco etapas principais que direcionam o processo de contratação:

  1. Elaboração do escopo e definição do perfil do cargo pela “autoridade política solicitante”, em conjunto com o CNDP. Na grande maioria dos casos, a “autoridade política solicitante” consiste no Ministério da Educação ou na “Regional de Educación” (equivalente a uma Secretaria de Educação no Brasil);
  2. Convocação pública – com base no perfil do cargo realiza-se a publicação da “convocatoria pública” (equivalente ao nosso edital/chamamento público);
  3.  Análise dos requisitos legais – nessa fase são averiguados os documentos encaminhados pelos postulantes, certificando-se da aderência aos requisitos legais;
  4.  Análise curricular – uma consultoria externa especializada, anteriormente credenciada, avalia o currículo dos candidatos e confere os antecedentes;
  5. Comissão qualificadora - composta pelos representantes da autoridade política solicitante, CNDP e Chefe da Educação Municipal. Os candidatos a Diretores, pré- selecionados pela consultoria externa, são entrevistados pelos integrantes da comissão. Por conseguinte, definem-se os nomes que comporão a lista final (geralmente de três a cinco candidatos), sendo então encaminhada à autoridade política solicitante para escolha e nomeação da contratação.

Ademais, os Diretores de escola e Chefes da Educação Municipal necessitam informar os resultados obtidos não só aos respectivos superiores hierárquicos, como também à comunidade escolar. A análise dos resultados alcançados ao final do ano letivo, à luz das metas previamente pactuadas, tem propiciado subsídios importantes para a gestão municipal, seja na identificação de oportunidades de melhora para o ano subsequente, seja na promoção de uma política meritória. O site do Ministério da Educação é um importante difusor dessas informações. Nesse contexto, as famílias podem encontrar uma rica fonte de dados, proporcionando maior conscientização acerca da vida escolar dos educandos.

Assim, o Diretor escolhido firma um convênio de desempenho por cinco anos, com avaliação anual junto ao seu superior imediato (Chefe da Educação Municipal). Esse arranjo tem fomentado uma convergência entre gestão e política, pois fortalece boas práticas gerenciais sem excluir os atores políticos, concedendo-lhes voz ativa nas decisões de contratação dos servidores. Dessa forma, cria-se um desenho institucional favorável à transformação de planos de governo em políticas públicas tempestivas.

O governo chileno pretende, em um futuro próximo, expandir esse mesmo processo (com as devidas adaptações) para a seleção de docentes. Esse modelo, ao conjugar vontade política e gestão por resultados, evidencia uma nova forma de se recrutar, selecionar, desenvolver e avaliar servidores públicos, ao promover critérios ancorados na competência técnica, no mérito, na flexibilidade, na confiança e na transparência.

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