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A Razão e o conhecimento

Autor: Carlos Bernardo González Pecotche

02/03/2020 10:21

Vamos falar nesta oportunidade algo sobre a razão e o conhecimento e, talvez, sobre algum outro ponto interessante. Existe na mente uma razão, faculdade à qual muitos atribuem um papel importantíssimo, primordial, ao considerar ser ela a que discerne sobre o bem e o mal, a verdade e o erro, o belo e o feio, o grande e o pequeno. Bem, eu perguntaria agora, em que medida esse discernimento se ajusta aos ditados da verdadeira razão; em que a razão da mente comum baseia seus juízos? Porque o certo é que não se pode falar de razão sem estabelecer diferenciações, nem sem antes conhecer o significado do que ela é e representa em realidade. Todos os seres humanos possuem uma mente igual e as mesmas faculdades, de modo que todos desfrutam do privilégio de ter uma razão. Entretanto, consta a todos nós que essa razão, ou os juízos elaborados por ela, são negados com reiterada frequência, tornando-se necessário lutar para defender o que se sustentou, não obstante ter consciência de não tê-la perdido. Outras vezes acontece que se quer ter mais razão do que os demais, como se esta faculdade fosse igual ao dinheiro, que uns têm mais e outros, menos, embora nem sempre por justiça de seus méritos. Observamos também que na criança, por exemplo, existe uma razão, da mesma forma que no adulto, mas não pode utilizá-la nem se servir dela como as pessoas que já cumpriram seus bons anos de vida; também há seres de idade avançada que tampouco podem servir-se de sua razão, não porque lhes falte, senão porque nunca a cultivaram.

Possivelmente sejam pouquíssimos os que se preocuparam em perscrutar dentro de si mesmos a fim de saber o que é a razão. A razão é e não é uma faculdade. Existe e não existe, e só atua com base nos conhecimentos que se tenha. É o conhecimento que lhe dá vida; sem ele não poderia exercer sua função diretriz como faculdade central da mente, pois o conhecimento constitui sua razão de existir. Daí que a razão da criança não possa discernir sobre uma mesma questão exatamente como o faria três ou quatro anos mais tarde. E daí também que, ainda que exista em todos – como dizíamos antes – o que se tem chamado de razão, nem todos podem se servir dela como corresponde, nem experimentar a segurança do que discerne, porque a razão não pode julgar somente pelo império de sua existência como tal. A razão requer o auxílio imediato do conhecimento para poder discernir; ela não pode estabelecer nenhum juízo sem antes haver buscado e reunido os elementos indispensáveis para tal função. De modo que os conhecimentos aumentam o volume e a consideração do juízo que essa faculdade central chamada razão vai elaborando, a qual, nutrida por esses conhecimentos, pode fazer com que estes, por sua vez, nutram a razão de outros.

De tudo isso se depreende que, quanto maior o conhecimento, maior a razão; e se os conhecimentos formam também a base permanente da existência, visto que esta encarna e se expande dentro de si mesma na intensidade da vida, é lógico pensar que, quando a razão se nutriu e se nutre constantemente com o conhecimento que lhe faz experimentar a realidade de sua função diretora, a consciência surge despertando em uma existência nova, que lhe dá, justamente, a consciência de tal realidade, uma vez que a razão não pode atuar sensatamente sem experimentar, antes, a consciência do saber pelo conhecimento. Algum dos presentes pode julgar, por acaso, o que ocorre neste momento em qualquer uma das ruas de Buenos Aires, como aquele que está assistindo a um fato? Impossível; entretanto, se alguém lhe relatasse e mediante a reconstrução mental do fato, poderia chegar a julgá-lo; mas se algum detalhe houvesse passado despercebido, ou se quem transmitisse a imagem do acontecido não o fizesse com fidelidade, seu juízo não poderia ser como o daquele que viu e conheceu o ocorrido em todos os seus detalhes. Por exemplo, quem se achasse em uma floresta poderia encontrar a planta para curar-lhe uma ferida, sem conhecê-la? Não; e até pereceria no mesmo lugar onde cresce a erva salvadora. Ao ignorar sua existência, não pode fazer uso dela, nem sua razão pode julgar sobre seu valor medicinal; ao contrário, aquele que a conhece, por meio desse conhecimento a utiliza e julga, ao mesmo tempo, sua bondade para curar feridas. É muito comum, na maioria das pessoas, emitirem-se juízos apressadamente, sem pensar que estes, por lei natural que gravita sobre todas as consciências, devem ser depois modificados, pois a verdade, ainda que por momentos esteja distante, costuma sempre aproximar-se e, às vezes, tão oportunamente...

O que ocorre é que a verdade é muito rica, enormemente rica, e a mentira muito pobre, enormemente pobre; e sendo a verdade tão rica, veste inúmeros trajes, conforme as circunstâncias em que tenha que atuar, e depois os deixa, oportunidade que a mentira aproveita para se vestir com eles, aparecendo assim, durante um tempo, como verdade. Mas a mentira tem um rosto que certamente não é como o da verdade, resplandecente e com graça divina. A mentira, querendo imitá-la, no final é descoberta, pois devendo mostrar-se repetidamente, acaba revelando sua mistificação.

Do Livro: Introdução ao Conhecimento Logosófico.

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