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Enquanto elas crescem, eu envelheço

Avançamos todas

29/08/2018 16:35

Cada vez que acordo mais cedo para passar o café e percebo que os pés delas já apontam fora da mantinha, as crianças crescem. No momento em que preparo o lanche, que não pode ser levado na lancheira porque “Quem ainda leva lancheira, mãe?” e me descubro ajuda inútil para a lição de matemática que, no fundo, não sei fazer, crescem.

E já que doem as costas porque dormi mais do que oito horas e se durmo menos, apetite e humor dão sinais de cansaço, eu envelheço. E sempre que afasto a embalagem do leite para focar as letrinhas miúdas porque “Quem disse que já preciso de óculos, filha?” e me dou conta de que ainda não domino o exercício de dividir o tempo, cobertor curto, envelheço.

Se constroem um argumento que surpreende tamanha a sofisticação, pronto, crescem. Se escuto de relance uma conversa cuidadosa com os amigos ao telefone, se leio um texto elaborado da escola, se empresto uma roupa que fica melhor nelas, elas crescem. E se as assisto dançarem, de longe e enxergo ali o poder e a beleza das infinitas possibilidades de uma vida em seu início, não tem mais volta, crescem.

E no dia em que a simplicidade passa a comover, envelheço. Quando o encontro com uma amiga cuidadosa faz o dia, quando a leitura ajuda a elaborar, quando a moda começa a perder importância, nada pronto, tudo a desconstruir, envelheço. Quando me pego dando um baile diante das impossibilidades, quando vejo beleza nos começos, nos meios e até nos fins. Voltar para quê? Envelheço.

Enquanto envelheço, elas crescem. Avançamos todas.

A imagem que ilustra este texto é de Victoria Dael

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