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Sobre deixar ir (e voltar)

O desejo de autonomia é legítimo. Claro que é. Os argumentos são sofisticados. Sempre são. Mas e a segurança?

21/02/2018 12:04

O ano letivo começou intenso e cheio de novidades por aqui. A mais festejada pelas crianças (questionada, pensada e remoída por mim e por Henrique) foi a do trajeto de ida e volta da escola.

Moramos a oito quadras de distância e sempre as levamos, caminhando. 

Grande parte dos colegas de minha filha mais velha (de 11 anos) que mora no mesmo bairro dispensa a companhia dos pais desde o ano passado. Ela vinha pedindo para experimentar essa liberdade há um tempo. Ensaiamos algumas idas principalmente nos dias em que a irmã (9 anos) frequentava o período integral e saía de casa antes dela. Eram certamente os melhores dias da semana para a Lara. Partia radiante com um amigo que mora a poucos metros de casa com a mochila nas costas, o vento no cabelo e uma vida inteira pela frente. 

Entre novembro e dezembro, foram os três (Sofia agora incluída) praticamente todos os dias sem adultos para a aula cheios de assuntos e donos do seu destino. Mas fincamos o pé na volta. Sair da escola, só com companhia. Até que...

As crianças reivindicaram o direito de ir e voltar por conta própria todos os dias: “Vamos em grupo. Somos muitos”. E foi aí que entrou a parte do questionar, pensar e remoer dos pais. O desejo de autonomia é legítimo. Claro que é. Os argumentos são sofisticados. Sempre são. Mas e a segurança? O entardecer? A avenida movimentada? As possibilidades todas? A cidade? Como se aprende a ficar a salvo? A partir de que momento podemos nos fazer presentes e conscientes nas avenidas movimentadas? O que nos faz estar preparados para conhecer as possibilidades? Que cidade é essa e como queremos fazer parte dela? 

Também não sei. Mas acredito que duas coisas antecedem obrigatoriamente esse caminho. A primeira é estar com os filhos, mostrar como se faz (como você faz) antes de deixá-los soltos com as próprias hipóteses. O que não quer dizer que eles vão necessariamente seguir sua cartilha, mas garante um repertório mais amplo. 

A segunda é ouvir. Saber se a criança se sente mesmo segura, se compreende a dimensão de cada nova responsabilidade e, mais importante, se se autorizou a dar esse passo (qualquer passo que seja). 

Checadas as duas, não nos restou nada além da confiança e da ladainha que vem se repetindo todos os dias. Tem dado certo. Vai dar certo. Deixar ir e deixar voltar. Parece que ter filhos é exatamente isso mesmo.     

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