Portal O Dia - Notícias do Piauí, Teresina, Brasil e mundo

WhatsApp Facebook Twitter Telegram Messenger LinkedIn E-mail Gmail

Fortalecer os atuais municípios, criar apenas municípios "fortalecíveis"

Confira o texto publicado na coluna Piauí Presente no Jornal O Dia.

19/11/2019 11:44

“Fortalecível” – a palavra parece que não existe; fica então criada, pois seu sentido é claro – o que pode ser fortalecido.

Desde que a Constituição de 1988 deu ao Município o status de ente federativo, o debate sobre o acerto e as consequências dessa decisão acontece. Agora vai se intensificar com a discussão do projeto enviado ao Congresso Nacional.

O debate tem a ver com a suposta equipotência conferida pela autonomia municipal, diante da imensa diversidade demográfica e econômica dos municípios; e tem a ver com as dificuldades de gestão das administrações municipais pela carência de pessoal qualificado.

De fato, houve uma explosão de criação de municípios no Piauí e no Brasil.  Entre janeiro de 1991 e dezembro de 1995 foram criados 103 novos municípios no Piauí; daí em diante, só foram criados três. É que a Emenda Constitucional nº 15 de 1996 tornou mais rigorosos os critérios para a criação de municípios. Numa década, passamos de 118 para os atuais 224 municípios.

O recenseamento da população dos municípios é feita a cada dez anos; mas a cada ano, o IBGE faz a projeção do crescimento ou decrescimento demográfico. Segundo a projeção da população para 2019, são 77 os municípios do Piauí que têm menos de 5.000 habitantes, limite que o projeto coloca para a permanência do município como autônomo. Provavelmente, todos os municípios do Piauí que se enquadram nessa categoria não têm 10% de receita própria no cômputo geral de suas receitas.

 Segundo o IBGE, 11 dos 78 municípios perderam população entre 2010 e 2019. O caso mais significativo é o de Alegrete do Piauí que viu sua população diminuída de 5.153 habitantes (acima do limite proposto no projeto) para 4.915. Perderam população também: Santana do Piauí, Francisco Ayres, Passagem Franca do Piauí, Paquetá, Sebastião Barros, Novo Santo Antônio, Vila Nova do PiauíSão Félix do Piauí, Olho d'Água do Piauí e Miguel Leão.

As receitas da maioria desses municípios se situaram entre R$ 10 milhões e R$ 15 milhões por ano, em 2017, último dado divulgado no site cidades@ do IBGE. Chamam a atenção os valores dos impostos próprios: IPTU, ISS, ITBI.

Há uma resistência das prefeituras dos municípios menores em cobrar IPTU. O valor arrecadado por alguns municípios é ridículo (desculpem a expressão): cinco dos 78 municípios recolheram menos de R$ 100,00 (isso mesmo!) de IPTU no ano de 2017; 11 municípios entre R$ 101,00 e R$ 300,00; 13 municípios entre R$ 301,00 e R$ 1.000,00; e 24 municípios entre R$ 1.001,00 e R$ 5.000,00. E aqui já temos 68% dos municípios do grupo. A maior arrecadação foi de R$ 67.900,00. Ora, nenhum desses municípios tem menos de 200 domicílios urbanos. Se cada um pagasse R$ 20,00 de IPTU por ano, a receita seria de R$ 4.000,00; se pagasse R$ 50,00, seria de R$ 10.000,00 por ano – valor que é atingido por apenas 11 municípios.

O ISS vem crescendo em quase todos os municípios, mas ainda totaliza uma receita muito pequena, 0 que reflete o pouco dinamismo econômico dos municípios, a informalidade das atividades econômicas ou o receio de cobrar imposto. Dos 77 municípios, 20 arrecadam menos de R% 50.000,00 por ano em ISS; 30 municípios entre R$ 50.000,00 e R$ 100.000,00; 22 entre R$ 100.000,00 e R$ 300.000,00; e apenas cinco acima disso, chegando a R$ 750.000,00. A exceção em 2017 foi Ribeira do Piauí, que arrecadou R$ 6.047.820,00, pelos serviços de instalação da usina solar. Uma arrecadação que é alta no momento da implantação das usinas e depois cai.

O ITBI também é insignificantes: 11 dos 77 municípios sequer registraram informação a respeito; e a arrecadação varia de R$ 30,00 (isso mesmo) a R$ 5.000,00 anuais para 60 municípios; apenas cinco municípios arrecadaram entre R$ 5.000,00 e 8.500,00 e um único arrecadou R$ 16.140,00. Reflete com certeza o pouco dinamismo do mercado imobiliário no município e o subregistro do valor de venda dos imóveis.

Precisaríamos adicionar os valores da repartição do ICMS e do IPVA arrecadados pelo estado mas computados legalmente como imposto próprio do município. Aqui também, os impostos refletem o dinamismo do PIB e, nos pequenos municípios, só é significativo onde há uma atividade do agronegócio ou industrial.

Os casos do ISS, ITBI, ICMS e IPVA apontam para a raiz do problema. Os limites da arrecadação são colocados pela base da tributação. Não se trata de reduzir repasses, mas de aumentar o peso dos outros setores além da administração pública e da seguridade social na adição de valor ao PIB.

Não resta dúvida de que a constituição de novos municípios melhorou a infraestrutura urbana nas cidades-sede. E o mais significativo: tornou mais acessível serviços públicos nas áreas de educação, atenção básica de saúde, assistência social, abastecimento d’água.

As despesas com a máquina burocrática precisam ser melhor analisadas. A remuneração de prefeito, vice e vereadores (todos com apenas 9 vereadores) não é grande em termos absolutos, mas os salários são desproporcionais à estrutura salarial do município. A estrutura de secretarias tende a crescer, pois quer reproduzir a organização administrativa estadual que, por sua vez, quer reproduzir a federal. E o empreguismo, embora em contratações temporárias, pesa bastante. A previdência é uma bomba-relógio.

A fusão de municípios, como regra geral, deve atingir o nível de vida da população. O que é necessário é envolver as administrações municipais no incentivo às atividades econômicas e a ampliação dos mecanismos de cooperação dos municípios entre si e destes com os estados.

Mais sobre: