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Modelo centralizado em internações não é novo, alerta psicólogo

Especialista no assunto alerta para a preocupação do cenário que se forma a partir do texto que espera a sanção do presidente Jair Bolsonaro.

25/05/2019 10:19

O texto que, agora, espera a sanção do presidente Jair Bolsonaro determina que o tratamento do usuário ou dependente de drogas ocorra prioritariamente em ambulatórios, admitindo-se a internação quando autorizada por médico em unidades de saúde ou hospitais gerais com equipes multidisciplinares. Diferentemente do previsto na Lei da Reforma Psiquiátrica (Lei 10.216/ 2001), a proposta não atribui à família ou ao responsável legal o poder de determinar o fim da internação involuntária.

Emanoel Lima, professor universitário e doutor em psicologia social, alerta para a preocupação do cenário que se forma. “É preocupante porque perfaz um caminho já questionado pela OMS (Organização Mundial da Saúde), que é o da internação integral e a longo prazo para o tratamento de demanda de saúde mental, o que inclui as dificuldades decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas”, destaca.


Emanoel defende tratamento que foca nas demandas psicológicas, sociais e de saúde - Foto: Elias Fontinele/O Dia

O professor considera que as alterações na lei consagram um cenário que desenha desde 2010, em função de lobbys da indústria psiquiátrica tradicional. “Esses dispositivos que trabalham a internação a longo prazo veem como a única resposta pra questão de álcool e drogas a internação. O Governo Federal vai dar um salto de 2 mil leitos em comunidades terapêuticas para 10 mil, e essas comunidades terapêuticas têm várias vertentes, a de querer vincular o problema de álcool e droga por uma visão moral, criminalista, ao invés de alguém que tem demandas psicológicas, sociais e de saúde. Várias pesquisas já mostraram que o grande problema que temos é do álcool e não do crack como se pensa”, afirma.


“É preocupante porque perfaz um caminho já questionado pela OMS (Organização Mundial da Saúde), que é o da internação integral", diz Emanoel Lima.


Uma das pesquisas destacadas pelo professor foi realizada pela Fundação Oswaldo Cruz, a Fiocruz, e divulgada recentemente pelos sites The Intercept e a Casa da Democracia. O levantamento aponta que 0,9% da população usou crack alguma vez na vida, 0,3% fez uso no último ano e apenas 0,1% nos últimos 30 dias. No mesmo período, maconha, a droga ilícita mais consumida, foi usada por 1,5%, e a cocaína por 0,3% dos brasileiros. No entanto, a pesquisa revela que 66,4% já fizeram uso de álcool na vida, 43,1% no último ano e 30,1% nos últimos 30 dias.

“Temos que entender que o manicômio não se restringe ao hospital psiquiátrico, o que foi o Meduna ou o Areolino De Abreu, ele pode ser reproduzido em diversos outros dispositivos. As comunidades terapêuticas, por mais que saibamos que existem diversas vertentes, muitas não querem ter equipe de saúde dentro do seu dispositivo, como um médico, psicólogo, assistente social. São comunidades que trabalham com moral religiosa, usando a perspectiva que quem usa droga é vagabundo ou desviando da ordem. Temos visto sobrar denúncias de violação de direitos humanos nesses locais”, explica.

Atualmente, existem mais de 1,8 mil comunidades terapêuticas espalhadas pelo país. No Piauí, são 24 comunidades terapêuticas regularizadas junto ao Governo.

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Por: Glenda Uchôa - Jornal O Dia
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