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Governo ignora auditoria do TCE e assina contrato de concessão da Ceapi

Relatório do Tribunal de Contas do Estado apontou uma série de irregularidades na licitação que escolheu a empresa que vai administrar a Central de Abastecimento do Piauí pelos próximos 30 anos.

03/05/2017 11:51

O Governo do Estado, através da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Rural (SDR), assinou na manhã desta quarta-feira (3) o contrato com a empresa Brazilfruit Transporte Importação e Exportação Ltda., concessionária vencedora da licitação que vai administrar, reformar, modernizar, expandir, operar e manter a Central de Abastecimento do Piauí (Ceapi) por 30 anos, cujo contrato tem valor previsto de aproximadamente R$ 83,5 milhões. 

A assinatura ocorreu na sede da União dos Permissionários da Ceapi (UPC), e contou com a presença de Viviane Moura, superintendente de Parcerias e Concessões; de Robert Eudes, presidente da UPC; do diretor da Brazilfruit, James Andrade; e do titular da SDR, Francisco Lima.

Assinatura do contrato ocorreu na manhã desta quarta-feira (Fotos: Elias Fontinele / O DIA)

A oficialização do contrato entre o Governo e a empresa contraria uma recomendação feita pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-PI), que identificou uma série de irregularidades no procedimento licitatório que teve como objeto a  outorga da concessão da Nova Ceapi, que inclui o uso  de  imóvel público, a  título  oneroso,  precedida  de obra  de  expansão,  reforma  e modernização,  com exploração, operação, manutenção e desenvolvimento do local.

Durante auditoria concomitante realizada pela Diretoria de Fiscalização da Administração Estadual do TCE-PI, os auditores identificaram uma série de irregularidades na licitação realizada pelo Governo, como a ausência de um projeto básico, o que viola o artigo 6º, inciso IX, da Lei de Licitações (Lei Federal nº 8.666/1993), bem como os artigos 4º e 18º da Lei de Concessões (Lei Federal nº 8.987/1995).

O relatório do TCE-PI afirma que a ausência dos detalhes presentes no projeto básico acabou por comprometer a eficiência do procedimento licitatório para a outorga da Ceapi. "[...] percebe-se  o prejuízo  causado  pela  falta  das especificidades que seriam apropriadamente tratados em projeto básico, tendo em vista que as informações discriminatórias dos detalhes da obra são tratadas, no processo administrativo da concorrência, em documentos superficiais, não apropriados para esta finalidade [...]", afirma o documento produzido pelos auditores do Tribunal de Contas.

Clique aqui para ver a íntegra do relatório 

Além disso, o TCE-PI afirma que a Secretaria  de  Estado  da  Administração  e Previdência (SeadPrev) não disponibilizou informações suficientes para que os licitantes pudessem avaliar o investimento necessário para que o contrato seja cumprido. "Assim, para que os licitantes pudessem determinar o valor da proposta de outorga, teriam  que levar  em  consideração  os dados  contidos  no  Termo  de  Referência  (que  fez  as vezes  de projeto  básico),  que  são inconsistentes  e  incapazes  de  apresentar  detalhes necessários  e suficientes  para  que  se possa  avaliar  o  custo  dos  investimentos  a  serem realizados", acrescenta o relatório da auditoria feita pelo tribunal.

Os auditores destacam, ainda, que informações imprescindíveis para levantamento dos custos da obra foram omitidas, como o estudo de terraplanagem, o tipo de pavimento a ser aplicado nas áreas de circulação dos veículos e caminhões, o tipo de estrutura dos galpões, o impacto ambiental do empreendimento e o preço de referência do investimento. "Infere-se de tudo isso, que, para que os eventuais interessados na concessão possam oferecer uma proposta com responsabilidade e segurança, a administração pública deveria ter apresentado informações suficientes e indispensáveis para o dimensionamento das soluções", pondera o TCE-PI.

Outro problema grave apontado pelo tribunal é o fato de que o imóvel onde funciona à Ceapi pertence a uma entidade distinta da que realizou a o procedimento licitatório, o que torna ilegítima a concessão do uso do bem público.

"De  acordo  com  o  Laudo  de  Avaliação  (Peça  13 –fls.  27),  o  imóvel  objeto  da concessão está localizado  na  Av.  Henry  Wall de Carvalho,  S/N,  bairro Tabuleta,  Teresina/PI, medindo 20.676,60 m². No entanto, conforme certidão do 2º Tabelionato de Notas e Imóveis de  Teresina (Peça  25),  o citado  imóvel  é  de  titularidade  da  Empresa  de  Gestão  de Recursos  do  Estado do  Piauí  S/A  (EMGERPI),  entidade  integrante  da  administração indireta  estadual  que  possui patrimônio  próprio  e  destacado  em  relação  ao  seu  controlador (Estado  do  Piauí  no  ato presentado  pela  SEADPREV  e  SDR,  órgãos  de  sua  administração direta)", pontua o relatório.

No documento, o TCE-PI recomenda que os órgãos "se abstenham de assinar e publicar eventuais contratos ou instrumentos correlatos até que o mérito  da  matéria  apontada  neste relatório de auditoria seja julgado em definitivo."

Deputado diz que Governo atropela as decisões do TCE-PI

O deputado Gustavo Neiva (PSB) citou o relatório apresentado pelo TCE-PI durante sessão realizada nesta quarta-feira na Assembleia Legislativa.

O parlamentar reiterou que a ausência do projeto básico dificulta a elaboração de propostas pelas empresas interessadas em participar da licitação. "Os técnicos constataram várias irregularidades nesse processo de concessão da Ceapi, a começar de coisas formais, pequenas, que não deveriam ter ocorrido. Por exemplo, a composição da comissão de licitação, que pela lei deveria ter pelo menos dois funcionários efetivos sendo membros. O Tribunal de Contas constatou que só um funcionário efetivo participou. Além disso, os técnicos detectaram a ausência do projeto básico no processo licitatório, e, ao contrário do Governo anda dizendo, esse projeto é obrigatório", afirma o deputado.

O deputado afirma que, por conta desse problema, a tendência é que o Governo sofra prejuízos no decorrer do contrato, uma vez que os erros presentes na licitação permitirão que a empresa vencedora peça aditivos no período do contrato, que é de três décadas.

Neiva criticou, ainda, a vedação à participação de consórcios no procedimento licitatório. "Quando você nega a participação de consórcios, você tem que fundamentar, e não houve essa fundamentação. Além disso, a licitação não pode exigir que a empresa comprove capacidade para comercializar uma quantidade mínima de produtos, porque quem vai fazer isso serão os permissionários. A empresa vai apenas administrar o centro de distribuição. Então, essa exigência é injustificada e impede a participação de mais empresas na licitação. Por isso, apenas uma empresa participou", opina o deputado.

O parlamentar ainda criticou o fato de o Governo do Estado ter assinado o contrato com a empresa Brazilfruit Transporte Importação e Exportação Ltda. mesmo com o relatório do TCE-PI manifestando parecer negativo à licitação.

Superintendente afirma que concessão é necessária para modernizar Ceapi

A superintendente Viviane Moura (Fotos: Elias Fontinele / O DIA)

A superintendente de Parcerias e Concessões, Viviane Moura, afirmou que a concessão é importante para permitir que a Central de Abastecimento do Piauí passe por um processo de modernização mais acelerado, e ressaltou, ainda, que o Governo vai deixar de ter um gasto com a manutenção do local, e passará a ter receitas, que corresponderão a 3,5% do total da receita bruta mensal da empresa, a partir do segundo ano de contrato.

"A gente está falando de uma central de abastecimento que foi criada na década de 70 e que ao longo desses anos não obteve, do ponto de vista de investimento em infra-estrutura, o que era necessário para se modernizar, até porque esse não é o perfil e não é o principal foco do estado, uma vez que se trata de um local em que ocorrem negócios privados. E, a partir do contrato celebrado com a BrazilFruit, a ideia é que a empresa viabilize os investimentos em obras nesses dois primeiros anos, na ordem de R$ 42,5 milhões, tornando a Ceapi mais moderna, com melhores condições de atender o destinatário final e toda a cadeia atacadista. E depois que a empresa mantenha a qualidade na gestão da central de abastecimento", afirmou Viviane Moura. 

James Andrade, diretor da concessionária BrazilFruit, afirmou que a central de abastecimento precisa de um choque de gestão, e citou como prioridades a melhoria na limpeza do local e da sua estrutura. "Um plano emergencial precisa ser feito de imediato. Nós estamos já com o plano pronto, e nos próximos 90 dias vamos atuar em algumas áreas que são críticas. Depois vamos passar para etapas de investimentos, como ampliações e algumas modificações nas estruturas existentes", afirma o diretor.

James acrescenta que a BrazilFruit também é uma permissionária da Ceapi, o que, segundo ele, está deixando os demais permissionários otimistas quanto à qualidade da nova gestão. "Ninguém melhor para dizer onde está apertando o sapato do que quem calça. Nós já somos permissionários há mais de 30 anos, conhecemos bem o dia-a-dia da Ceapi e sabemos onde estão os gargalos", concluiu James Andrade.

Por: Cícero Portela e Ithyara Borges
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